Mar Egeu 2011 – Bebe do poço e dá o teu lugar a outro

O veleiro Fraternidade agora é uma escola internacional. Em Odessa se juntou à tripulação o americano Adam, que estava viajando há três meses pela Ucrânia. Aqui em Mytilene, na Grécia, meu comandante Aleixo Belov recebeu o ucraniano Boris e na próxima semana chega a Janaina, mais uma tripulante brasileira. Até Gibraltar estará se formando, assim, a terceira turma de alunos.

Nós fizemos parte da tripulação numa espécie de “férias” do projeto. Meu comandante não quis trazer novos alunos no trecho infestado de piratas do Índico e na navegação complicada do Mar Vermelho. Só assim para ele aceitar a bordo dois velhinhos (eu já contei que minha filha Joana está grávida?) e que ainda por cima fumam e bebem (no meu caso, agora, muito socialmente).

Tem um secular provérbio árabe que diz mais ou menos assim: bebe do poço e dá o teu lugar a outro. Eu já bebi na fonte e não me saciei, mas é hora, como diz o poeta, da turma jovem mostrar seu valor. Estamos há três meses e uma semana a bordo do Fraternidade, quando navegamos 2762 milhas em 521 horas. Cruzamos mares multicoloridos (vermelho, azul mediterrâneo, cor de mármore e negro), atravessamos estreitos e o Canal de Suez. Carimbamos o passaporte em cinco países e visitamos 15 cidades em 10 escalas.

Aleixo Belov não move montanhas, ele as explode (e como bom engenheiro, às vezes, usa carga dupla de dinamite). A escala na Índia, quando fez um ashram – meditação em um retiro espiritual – com a famosa e adorada guru Ama, lhe deixou mais zen (sua leitura de bordo tem sido o filósofo Osho). Mesmo assim, pense num homem agitado! É um estilo bem diferente do meu. O meu comandante é um navegador de águas profundas, eu, como ele mesmo diz, sou das beiradas, de águas rasas, que gosta de botar o barco em qualquer buraco. De Finike para Istambul, fizemos o Mar Egeu sem parar em nenhum fundeio. Um pecado para um cruzeirista de carteirinha como eu, mas em compensação as escalas são demoradas (ficamos um mês no Egito e 25 dias em Odessa, o que dá pra explorar com calma os novos lugares).

Aprendi muito, molhei a canela em águas que nunca imaginei um dia navegar, ganhei do comandante pelo menos quatro partidas de xadrez (não é necessário contar que ele me ganhou em mais de 20) e perdi 8 quilos (está provado que cerveja engorda!). Acredito que também ensinei um pouco (pelo menos para Hermann, meu parceiro de turno do Sudão à Istambul, e agora pra Adam), algumas tarefas cumpri com afinco (fui alçado ao cargo de imediato), noutras sei que falhei completamente (como na edição dos filmes) e até esquecer meu equipamento fotográfico num banco da praça dedicada à poetisa Sapho, contribui com 786 fotos para a documentação do projeto. Definitivamente minha praia é a imagem estática.

Completamos nossa pós-graduação de carona na 4ª volta ao mundo de Aleixo Belov, num trecho cheio de significados. A volta às raízes velejando com seu novo barco, a maquina de transportar sonhos chamada Fraternidade.

Agora só temos que torcer para que tudo dê certo no retorno da intrépida trupe ao Brasil e esperamos estar no píer para receber suas amarras. Nosso beijo grande nos tripulantes Lito e Taís e especialmente no comandante Aleixo Belov, por nos ter aguentado todos esses dias e pela oportunidade única dessa viagem, no mínimo, tão exótica.

Amanhã cedinho começa a maratona do retorno: hora e meia de ferry boat para a cidade de Ayvalik, na Turquia, mais 6 horas de ônibus pela Ásia Menor quando chegaremos à Istambul, onde, depois de 3 dias, pegaremos um vôo pra São Paulo e depois para o Rio. Ufa!